O presente capítulo vem tratar da relação feita entre os Meios de comunicação de massa e a produção de subjetividade, tendo por ponto de partida o desenvolvimento do capitalismo moderno que afeta as relações de produção e por sua vez determina a construção de uma subjetividade.
Essa subjetividade fabricada, modelada, recebida e consumida atinge o inconsciente dos indivíduos, já que "são afetos produzidos, socialmente, pelo capitalismo moderno e estão diretamente relacionados com o modo dos indivíduos perceberem o mundo, de se "modelizarem" os comportamentos e de se articularem as suas relações sociais". Interessante notar que parece existir uma repetição a menção de modelagem da subjetividade, no Behaviorismo, enquanto que aqui se coloca por modelização, sendo a primeira explicada por aproximações sucessivas, e a segunda é quando a subjetividade é criada socialmente a partir de um processo de homogeneização. Esse processo se dá quando a "subjetividade capitalística" vem trazer uma idéia de individualidade, assim como de interioridade, tal como uma essência humana, pré-social. Este quadro retira o caráter transformador da sociedade, para no fim formar uma massa homogênea, porém estratificada individualmente, com o ideal de trabalhador livre.
Está-se falando de uma grande máquina - o capitalismo moderno - produzindo um "jeito de ser" tanto tanto a nível macropolítico - definindo questões sócio-político-econômico-culturais da sociedade - como a nível micropolítico do desejo - estes que permeiam os pequenos gestos do nosso cotidiano (o qual foi tratado no capítulo III sobre Psicanálise). Ou seja, respectivamente, tem-se, não só num plano representacional (consciência), como também planos semióticos heterogêneos (inconsciente) o qual é reduzida a um proceso de subjetivação dominante e cristalizado por conta do poder. Compreende-se a produção de uma micropolítica como a reprodução (ou não) dos modos de subjetivação dominante, tendo ao mesmo tempo os vetores de expressão criativa (de singularidades) que se delineiam.
Ao se tratar da produção inconsciente, o qual é reduzida aos processos de subjetivação dominante e cristalizada a partir de um poder instituido, Foucault é citado por tratar do conceito da mecânica do poder. O autor vem relatar que ela se expande por toda a sociedade nas formas mais regionais e concretas, por parte de instituições e tomando o corpo através de técnicas de dominação (muito se assemelha às técnicas behavioristas que condicionam o corpo e o apreendem a nível do comportamento). Nesse caso o corpo é dominado pela sociedade, quando penetrando pelo cotidiano, carcaterizado como micropoder, que atravessa as relações no microtecido social. Poder é considerado, por Foucault como um exercício, que se efetua, uma relação, que provoca resistências, porém nada fixo, mas sim com pontos móveis e transitórios que se distribuem por toda a estrutura social.
Adiante no texto, afim de se ter uma melhor visão da questão das formas de dependência, salienta-se que isso se deve ao fato de não só ser conseqüência de processos econômicos e sociais (que envolve forças produtivas, conflito de classes e estruturas ideológicas), como também envolve as relações de exploração e de dominação. Não é a toa que a produção da subjetividade se dá tanto a nível dos opressores como dos oprimidos. No entanto, tudo isso só não dá conta do mecanismo de sujeição da subjetividade que acontece na combinação complexa de técnicas de individuação - em que o a subjetividade tem por carcterística a interioridade e individualidade - e de procedimentos de totalização ou homogeneização já mencionado.
Daí, se aponta para a formação de uma massa que tanto é "indivíduo", como "sujeitos", sendo o primeiro caracterizado como despersonalizado, visto por um ideal igualitário capitalista (fruto da homogeneização) e o segundo resultado de um sistema hierarquizante e autoritário de códigos morais que regem as relações pessoais. Ao observar essa situação, percebe-se uma realidade vista como universal, porém tida para cada um como pessoal e circunstancial, que é construída exatamente pela concepção de mundo difundida, através dos Meios de Comunicação. Estes enraizam cada vez mais tais "modos de subjetivação", "intensidades de vida", "desejos", que são os produtores e agenciadores de sentidos de real, compreendendo que o real se cria no social, ou seja, somos co-produtores de nossa realidades e não só meras vítimas iludidas.
Tentando dar conta dessa idéia do desejo, é explicado no texto como movimentos intensivos que são expressados através da subjetividade, entendidas como modos de os indivíduos perceberem o mundo e articularem suas relações sociais. O desejo, de acordo com Rolnik, é um produtor de universos psicossociais, a partir de três movimentos: 1) por meio dos afetos - intensivo e inconsciente - com o poder de atração e repulsa; 2) quando afetos buscam exteriorizar - tomando corpo em matéria de expressão; 3) Com a formação de territórios existenciais - num plano visível, consciente, estando num aglomerado de diferentes matérias de expressão, onde os afetos se situam e se concretizam.
É exatamente ligando esse processo aos Meios de Comunicação que essa situação se configura, pois se utilizando da linguagem intensiva, que estabelece conexão direta entre as instâncias psíquicas (definem o modo de perceber e constuir o mundo) e o que é produzido pelo capitalismo. Por isso o desejo se torna uma intensidade nômade sempre à procura da linguagem para que possa se expressar. Assim o processo basicamente acontece quando a mídia capta as intensidades (que são movediças e mutantes), que são investidas de significados ao se criar uma linguagem onde o desejo se concretiza e acontece, daí a formar o desejo no social. Com isso o desejo perde ou anula seu anterior caráter ativo de possibilidade de produções singulares no social, que também faz perder a possibilidade de uma multiplicidade de singularidades revolucionárias. Tal fato aconteceu já que o desejo se vinculou a uma intensidade homogeneizadora de sentidos.
Portanto é possível afirmar que os Meios de Comunicação são um importante equipamento maquínico capitalístico, já que cria o indivíduo do capitalismo mundial integrado (globalizado), ao mesmo tempo produz uma massa desenraizada produtiva (ou seja um indivíduo que técnico, que não se importa com sua história, que esquece dela), o que mantém um sistema hierarquizante de produções. É através dos Meios de Comunicação, em que a massa social não se comunica, que se ratifica como um meio bastante eficiente na criação de códigos totalizantes de dominação.
No entanto, "os movimentos se desmancham e novos se articulam de forma independente", assim se coloca no texto, afim de mostrar que é possível burlar a interdição da mídia e desenvolver circuitos de comunicação auto-suficientes e de exteriorização intensiva de atualidade, que traz a oportunidade de potencialidade de ação capaz de fazer implodir ou explodir as estruturas institucionais hegemônicas. Da mesma maneira, a forma estética pode, enquanto intensidade criativa, não só socializar a memória, como também recuperar o potencial de transformação e construção do social, através da criação de uma outra linguagem transversal, transubjetiva e social.