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10 de set. de 2007

Fichamento - "A Loucura e a Sociedade" (Michel Foucault)

Ao acusar os sistemas de pensamento no Ocidente de abarcar somente os fenômenos positivos de uma sociedade, Foucault avalia, que não se trata mais de saber apenas o que é afirmado e valorizado em uma sociedade ou em um sistema de pensamento. Para ele, a atenção destes sistemas deve-se voltar também para o que rejeitado e excluído. Nesse sentido, conta que a loucura foi excluída em todos os tempos. E é sobre essa questão que o autor revela seus interesses e inquietações para produzir uma análise histórica da loucura.
A título de metodologia, as problematizações concentram-se em “como as condições nas quais o louco se encontra mudaram da Idade Média aos nossos dias”. Para tanto, Foucault examina qual o status do louco nas sociedades primitivas e como isso se configura nas sociedades industriais, e pensa sobre a causa da mutação que se operou no século XIX.
Como configuração inicial da sua análise, Foucault avalia que os domínios da atividade humana estão divididos em quatro categorias: o trabalho, a sexualidade, a linguagem e as atividades lúdicas (jogos, festas), afirmando que as pessoas que escapam às regras definidas nesses domínios são chamadas de indivíduos marginais, comumente presentes em todas as sociedades. No caso da loucura, uma mesma pessoa passa a ser excluída e rejeitada em todos os domínios. Aqui, então, o autor analisa também o louco diante das quatro categorias, já que o mesmo difere em seu comportamento das outras pessoas no trabalho, na família, nos discursos, nos jogos, etc.
Com relação à sexualidade, somente a partir do século XIX, práticas sexuais como masturbação, homossexualidade, ninfomania foram consideradas anomalias identificadas à loucura por serem incapazes de adaptação à família burguesa européia. A idéia de que a principal causa da loucura residia na anomalia sexual consolidou ainda com Beyle, relacionando a paralisia progressiva com a sífilis, e com Freud, desenvolvendo teorias sobre o distúrbio da libido.
Na Idade Média, no que diz respeito à linguagem, a fala dos loucos ora era dada como sem valor, ora prestavam-lhe uma atenção particular. Para contextualizar tal afirmação, Foucault faz referência aos bufões europeus, os quais contavam a verdade sob forma simbólica que os homens comuns não fariam. Faz referência ainda a uma curiosa afinidade entre a literatura e a loucura, especialmente, porque a primeira não está obrigada às regras da linguagem formal e cotidiana, ocupando a literatura uma posição também marginal.
No teatro tradicional europeu, como exemplo de atividades lúdicas, o louco divertia os espectadores, era um personagem que exprimia a verdade de que os outros atores e espectadores não estariam conscientes. Outro exemplo está nas festas que na Idade Média, havia apenas uma delas que não era religiosa, a festa de Loucura, onde os papéis tradicionais eram invertidos e todas a instituições sociais, lingüísticas, familiares eram derrubadas e questionadas.
E, como última análise, a inaptidão ao trabalho foi considerada o primeiro critério da loucura. Historicamente, na Idade Média, os loucos eram admitidos e podiam vagar pela cidade; eles não se casavam, não participavam de jogos, eram alimentados e sustentados pelos outros (família), mas também, por vezes, tornavam-se excitados e perigosos, sendo afastados e “presos”. Entretanto, no século XVII, constituindo-se a sociedade industrial e a existência dessas pessoas não foi mais tolerada. Foram criados estabelecimentos para todos aqueles que se encontravam fora da ordem social, a saber, loucos, desempregados, doentes, velhos, prostitutas, considerados grupos de vagabundos para a nova sociedade. Uma grande ironia, colocada pelo autor, é o fato de que nos hospitais psiquiátricos modernos, pratica-se o tratamento pelo trabalho, sendo este o principal critério para a exclusão do louco. Ora, bastaria curar a loucura com trabalho.
No século XVIII, Pinel e Tuke, ao considerarem os loucos como doentes, “libertaram” destes estabelecimentos todos os vagabundos, já que, dentro da lógica industrial, eram aptos a trabalhar. Separadamente, os loucos não tendo a faculdade de trabalhar, tornaram-se pacientes cujos distúrbios tinham causas que se referiram ao caráter psicológico. Pinel e Tuke tornaram o estabelecimento de internação um hospital psiquiátrico, abrindo as portas para o nascimento da psiquiatria, cujo objeto de estudo configurava-se nos distúrbios mentais.
Em última e principal análise, Foucault revela que tal medicalização do louco produziu-se por razões econômicas e sociais, pois o status do louco não variou em nada entre as sociedades primitivas e avançadas. Em outras palavras, em nossa sociedade pouquíssimas coisas revalorizaram o status do louco, mas ela ainda continua o excluindo. Isso só demonstra, para Foucault, o primitivismo de nossas sociedades.