19 de jul. de 2007

"Para desencaminhar o presente Psi: biografia, temporalidade e experiência em Michel Foucault"

Tentando retomar um pouco do que apresentei na reunião passada, foi colocado que o texto foi uma incumbência dada à Heliana Conde de fazer a apresentação do livro “Foucault e a Psicologia”, de maneira que não fosse uma atitude simplesmente prefaciante, que seria o de decifração ordenadora. A autora vem tentar ir de encontro, ao que o próprio Foucault vem chamar de ordem do discurso, ou seja, práticas logofóbicas (que tem medo de representações) hegemônicas que não toleram a surpresa o aleatório, o inaudito que permeiam ditos e escritos. E obviamente, junto com o propósito dos autores do livro que ela apresenta, que seria “atos discursivos que conclamam à pontecialização recíproca”, preferindo “ensaiar uma experimentação compartilhada”.
Continuando a fazer uma menção geral de seu objetivo, a autora comenta que Michel Foucault afirmou que seus escritos seriam “fragmentos de autobiografia”. Essa afirmação poderia ser comparada a certa “identificação disciplinar” que alguns psicólogos tivessem em relação às hipóteses de trabalho de Foucault. Mas pensando em biografia, tem-se nas colocações de Didier Eribon apenas que Foucault teria tido uma juventude passando por hospitais psiquiátricos, fascinado pelo teste Rorschart, lecionou Psicologia e inclusive pensou em se tornar um. Ora, essa forma de se fazer Biografia, ao olhar de Conde, demonstra ser oposto à menção de sujeito constituinte, que possui muito mais do que meras considerações de ações, posições, entre outros. Ou seja, torna-se necessário evitar enfoques redutores, daí a necessidade de acordo com a autora e se tecer as explicações e articulações do que Foucault fez sobre temporalidade e experiência.
Nesse intuito, tentando dar conta dessas conceituações, a autora inicia comentando sobre a obra “A palavra e as coisas” que teria sido mais um exemplar do ápice do estruturalismo na França, onde inclusive se estaria tratando de epistemes - “conjunto de regras a que obedecem os modos de ver e dizer presentes em um conjunto de saber simultâneos”, ou seja, saberes que vieram antes de serem enquadrados pelas ciências. Entres esses epistemes tem o descontínuo, caracterizado por uma série de sistemas de longa duração. Porém, afim de defender dessa menção anteriormente que Conde vai trazer duas passagens desse mesmo livro: uma que trata do descontínuo, considerado por aquilo que dá acesso à erosão do que vem de fora, ao pensamento que está fora do domínio daquilo que se tem contato, de certa forma, conduzido pela cultura de uma sociedade, daí a autora se indaga de como um pensamento pode ter lugar no mundo e não cesse de começar sempre de novo?
A segunda passagem colocada por Conde fala do problema das mutações, de se é possível explica-las por acontecimentos ou leis. Tais mutações são exatamente aquilo que faz com que se perceba as coisas de forma diferente. No entanto, a autora enfatiza que não basta explicar as mutações, mas sim analisar essa abertura na continuidade, esse acontecimento radical que transforma a superfície do saber e que se é possível observar os abalos e efeitos. Nesse caso, de acordo com livro mencionado, ressalva-se que quanto às descontinuidades, levando em conta os pensamentos ou discursos, tona-se necessário fazer correlações, seja para descobrir ou inventar, com outros tipos de séries. Já no que tange as estruturas, para que de fato apareçam, não devem seguir leis, mas sim os acontecimentos, desde que problematizados. Ou seja, Conde relata que para um livro tão estruturalista, como pode ter Foucalt ter combinado acontecimento e estrutura, “dar conta da estrutura através do acontecimento!”? No entanto, o acontecimento aqui não está ligado a grandes feitos, nem mesmo fatos consumados, mas que apontem a entrada de forças ou ocorrências de acontecimentos rupturais. Com isso, para a coerência do sujeito e/ou suas causalidades poderia ser admitida a diferença.
Para melhor elucidar essas e outras questões, Conde se utilizará do comentador, um tipo de função que não agradava a Foucault, mas que no caso de Mitchell Dean, coube ser trazido. Este teórico se dizia insatisfeito com o recurso das categorias globalizantes, que seria tudo aquilo que compõe a modernização. Através destas categorias é que ciências sociais tentam compreender o presente, conseguiram o prestígio de uma ciência nomotética*, sob o preço de negar a presença da história, apesar de serem chamadas de ciência da história. A sociologia estaria integrando duas formas duas formas aparentemente contrastantes, de acordo com Dean.
Uma dessas formas é a teoria progressivista, que “defende um esquema de progresso social fundado em uma teleologia”, seja “da razão, da tecnologia ou da produção”. Existiriam, então, narrativas denominadas de alto modernismo, que embasariam suas explicações de maneira geral ou causal, com um caráter semelhante ao de uma lei. A outra forma mencionada é a da teoria crítica, que estaria negando e preservando as formas presentes de razão e sociedade. Esta teoria estaria buscando uma versão alternativa para a razão instrumental, com narrativas que estariam incluidas no modelo denominado modernismo crítico. Tais narrativas podem exemplificadas pela Teoria da Racioalidade Comunicativa de Habernas e a Dialética do Iluminismo de Adorno e Horkheimer.
É tendo em vista toda essa discussão de moderno que Dean se indaga "se fomos, somos ou seremos modernos". Nada mais enganoso do que querer se explicar pelo termo modernização, visto que se trata de uma armadilha, pois é através dele que se faz a des-historização. Se por um lado no modernismo pensa que o presente será caminho, para o modernismo crítico será descaminho, mas em nenhuma se pensa des-encaminhado. Por conta disso que o sociólogo Dean traz uma terceira prática para o pesquisador social, a dita problematizante. Esta estaria designada a analisar a trajetória das formas de verdade e conhecimento, que acarretaria a perturbação das narrativas, onde ao invés de descobrir respostas, estaria atrás de questões. Não é a toa que essa prática se manteria receptiva "à dispersão das transformações históricas, à rápida mutação dos eventos, à multiplicidade das temporalidades e, primordialmente, à possibilidade de reversão de trilhas históricas".
Um problematizador, segundo Dean, é também um crítico, com estratégias distintas dos modernistas críticos, pois se recusa a aceitar os componentes dados como óbvios e também as explicações oficiais das coisas. Com isso é possivel existir um inquérito ilimitado acerca do presente, evitando a idéia de constrangimentos contingentes que possam estar manipulando seja o conhecimento, seja a ação política, através de sínteses filósóficas.
Dean ressalta o perigo das palavras, acatando a denominação de Pós-modernismo, desde que significasse a problematização do dado, ilimitando a possibilidade de interrogação.
No final das contas, o que se afirma é um método trazido por Foucault em suas obras seria a descrição de investigações anteriores, ou a antecipação de experimentações futuras. Estas características foram delineados também no livro "Arqueologia do saber" que situa a novidade do estatuto singular no documento histórico. O documento seria tanto organizado em séries, quanto contraposto à questão do problema. Tudo isso levantaria a questão polêmica de qual deve ser o problema: encaminhar ou desencaminhar o presente? Pensando nisso que os textos foucaltianos dos anos 70 estavam determinados a demonstrar o verdadeiro adversário para uma história que deve ser além de crítica, cônscia de seus limites e efetiva, afim de intervir no presente. Tal adversário é todo um supra-histórico que nos rodeia e condicionam os modos de ser, pensar e agir através de modelos identitários.
É de acordo com Nietzsche que Foucault, segundo Conde, aponta a presença de usos do supra-histórico na própria disciplina da história, que pode ser: monumental (quando caracterizado por grandes feitos); antiquário (quando há a acentuação da continuidade-tradição) e crítico (quando há o julgamento-condenação do passado, tornado-o fixo, paralisado e menor). Como alternativas, Nietzsche projeta usos: paródico (quando contrário a uma reminiscência-reconhecimento); dissociativo (quando contraposto a identidade) e sacrifical (ao renunciar à vontade de verdade). Graças a estes artifícios, é possível fazer uma história longe de modelo metafísicos e antropológicos da memória, ou seja, obter uma contramemória e por sua vez, uma outra forma do tempo. A história seria singularmente crítica e efetiva, pois constrói e analisa arquivos, orientando teoricamente nossos procedimentos, só que quando embasada na genealogia é que se afasta o ideal positivista.
Vem a tona um termo ressaltado por Dean chamado de presentismo ou história do presente, que trata do presente estando longe de compreensões simplistas, como se o presente fosse "resultado de um passado aprisionado em significações".
* nomotética: que se refere à legislação ou ao processo e fazer leis; diz-se dos juizos inferidos da observação dos fatos que a todos se impõem, adotados uma escala e um método, em oposição a de experiências pessoais ou juizos idiográficos.

4 comentários:

Andressa disse...

Essa é uma primeira parte do texto. Colocarei a segunda parte em breve e em seguida a terceira e última parte. Espero as críticas... Inté

Nelma disse...

Depois de algumas tentativas (sem sucesso), desisti de imprimir as páginas que a Andressa disponibilizou no e-mail do grupo. Felizmente, enquanto procurava o material para um trabalho de TSP II, dei uma olhada nas apostilas da disciplina de Kleber. Não é que eu tenho a cópia da apostila? Devo ter tirado junto às da disciplina.

Volto a comentar quando terminar de ler a apostila e o post GIGANTESCO.

Andressa disse...

PÔ, não posso nem negar, de fato foi gigantesco, pq tentei resumir sendo explicativa. Enfim, caso prefiram q seja mais sintética tentarei ser...hehehe. No mais, acabei de postar a segunda parte do texto e quanto antes tentarei postar o último, coletar os comentários e fazer minha resenha!! Ufa... é isso aí! Inté a reunião terça de manhã 9 na UFS!

Kleber disse...

Lido. Vou imprimir e a gente discute na reunião. abraço!