8 de ago. de 2007

"proibido colar cartazes"

BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas II: rua de mão única. São Paulo. Brasiliense, 2000. (30-31)


A técnica do escritor em treze teses

Quem tem a intenção de passar à redação de uma obra mais extensa procure seu bem-estar e permita-se, depois da tarefa concluída, tudo o que não prejudica a continuação.
Fale do realizado, se quiser; contudo, durante o decorrer do trabalho, não leia nada dele para outros. Toda satisfação que você se proporciona através disso bloqueia seu ritmo. Com observância desse regime, o crescente desejo de comunicação acaba tornando-se motor do acabamento.
Nas circunstâncias de trabalho, procure escapar à mediania do cotidiano. Meia tranqüilidade, acompanhada de ruídos insípidos, degrada. Em contrapartida, o acompanhamento de um estudo musical ou de uma confusão de vozes pode tornar-se tão significativo para o trabalho quanto a perceptível quietude da noite. Se esta aguça o ouvido interior, aquele se torna a pedra de toque de uma dicção cuja própria plenitude sepulta em si os ruídos excêntricos.
Evite utensílios quaisquer. A pedante fixação a certos papéis, penas, tintas, é de utilidade. Não luxo, mas abundância desses utensílios é indispensável.
Não deixe nenhum pensamento passar incógnito e mantenha seu caderno de notas tão rigorosamente quanto a autoridade constituída mantém o registro de estrangeiros.
Torne sua pena esquiva à inspiração, e ela a atrairá com a força do imã. Quanto mais refletidamente você retarda a redação de uma idéia que ocorre, mais maduramente desdobrada ela se oferecerá a você. A fala conquista o pensamento, mas a escrita o domina.
Jamais deixe de escrever porque nada mais lhe ocorre. É um mandamento da honra literária só interromper quando um prazo (uma refeição, um encontro marcado) deve ser observado ou a obra está terminada.
Preencha a suspensão da inspiração passando a limpo o realizado. Com isso a intuição despertará.
Nulla dies sine línea – mas talvez semanas.
Nunca considere perfeita uma obra sobre a qual não se sentou uma vez desde a noite até o dia claro.
Não escreva a conclusão da obra no local de trabalho habitual. Nele você não encontraria coragem para isso.
Graus da composição: pensamento – estilo – escrita. O sentido de passar a limpo é que, em sua fixação, a atenção diz respeito somente à caligrafia. O pensamento mata a inspiração, o estilo acorrenta o pensamento, a escrita remunera o estilo.
A obra é a máscara mortuária da concepção.

3 comentários:

Kleber disse...

Descobri esse texto do benjamin, quando estava escrevendo a minha tese. Foi um feliz achado. Devo dizer que minha leitura dele não foi e ainda hoje não é objetiva. Acho que suas teses do Proibido colar cartazes são parcerias para o desejo de escrever, a "necessidade" de dizer de si e de dizer do mundo. Não creio que sirvam para fundar o grande escritor, afinal "A obra é a máscara mortuária da concepção". Abraço!

Juaum disse...

Bonito, kleber. Como eu costumo dizer, escrever são nove meses em trabalho de parto.. cada um tem um modo de dizer de si e dizer do mundo. o que torna a leitura um fazer agradável por tamanha possibilidade de se relacionar com tipos de textos e linguagens.
é por aí.

Andressa disse...

Pra mim esse trabalho "9 meses" de escrita tem sido desgastante e relutante, principalmente porque temos q nos dobrar ás regras do "bom" português e da tal ABNT, que diferente desse bunito texto exposto, nos priva de sermos criativos, exagerados, ou até meio desajeitados. AH! Mas sim, tudo pela clareza, se não quem entenderia o outro via um meio de comunicação indireto como a escrita. Blz...nos acostumamos a tudo. Inté