27 de jul. de 2007

Parte 3 - "Das lições da história às experiências e experimentações: o abalo do presente"

Dando prosseguimento ao texto de Heliana Conde, a autora se utiliza do artigo de D'amaral e Pedro que trata da discussão sobre modos de temporalidade que os historiadores constroem e narram. Estes podem ser:

  1. História universal do tipo positivista - como se o narrador ocupasse o lugar do "fins dos tempo", ou seja, a extremidade de uma linha reta que caracteriza o tempo e a história. Esta história estaria caminhando em nossa direção. Pensa-se o passado como naturalmente justificado por uma cadeia causal de fatos justificados. Os positivistas foram os primeiros a admitir um fim da história, onde ocupariam o lugar idealizado, em que se estaria a meta, o objetivo, a finalidade a ser alcançada.
  2. O modo do paradigma indiciário - termo esse descrito por Carlo Ginzburg e significa dizer as práticas historiográficas quando posicionadas contra a história tipo positivista. Essa vertente acredita que o presente vive do passado e deste deve procurar uma verdade oculta e invisível. Seria então o presente um momento particular, pois construído a partir de certa realidade do passado.
  3. Modo de relacionar tempo e narrativa - do tipo foucaultiano, em que não foca nem na 1ª e nem na 2ª forma de entender temporalidade, mas sim numa que relaciona o presente com ele mesmo. Ou seja, uma história do presente expressada por Foucault para designar o trabalho construtivo do historiador, ao perceber o desprendimento do presente dele mesmo, quando "a história do presente é feita no presente sobre o presente".

Para melhor contribuir nesse entendimento que Conde se utiliza de um artigo de Deleuze que menciona que Foucault estaria fazendo um trabalho de filosofia dos dispositivos.Na afirmação de Deleuze: "Nós pertencemos aos dispositivos e agimos neles", aponta-se os conceitos de história e atual, em que o primeiro seria o que somos, e o segundo o que estamos em vias de nos tornar.

Fica mais claro ao distinguirmos o que seria o ontem, o hoje e o passado. Nesse caso o ontem é a dimensão do presente, pois é o que somos e deixamos de ser ao mesmo tempo. O hoje significa ser o atual, já que se trata do que estamos nos tornando. E o passado seria a história que se configura no espaço entre o ontem e o hoje. Dessa maneira, o passado não é o que nos fundamenta, mas sim algo ficcionado, de acordo com aquilo que existe nesse espaço entre o ontem e hoje, presente e atual, respectivamente. Porém, só válido desde que haja uma reflexão sobre esse movimento e quando assimilando novas experimentações.

Para Conde, esta possibilidade de conceber o mundo sob esse prisma de temporalidade fica estampado nos trabalhos de Deleuze, assim como nos últimos de Foucault. A problematização aparece sempre, mesmo quando interligada aos temas da biografia, da experiência e dos usos estratégicos da história. O que acontecia é que a experiência, aliada a uma reflexão historiográfica, quando envolvida por uma inquietação, torna-se um ponto de partida para um trabalho teórico, prático e político. Daí podemos chamar de "experiências transformadoras", como Foucault mesmo denominou. Seria a partir dessas experiências, as quais estariam comprometidas em se engajar politicamente, confrontar normas institucionais, entre outros, que o trabalho teórico de Foucault se construiu, levando a "algum fragmento de autobiografia".

Assim foram com obras como História da Loucura, em que freqüentou hospitais psiquiátricos ou na obra Arqueologia do saber (dessa obra não saberia bem explicar como procedeu a sua experiência). Também aconteceu com a obra Vigiar e Punir, que a partir das experiências do Grupo de Informações sobre as Prisões (GIP), aparentemente particular a um certo lugar, demonstrava-se bem mais ampla, pois estaria inscrita em algo que estava em curso, em ações não afastadas, mas comuns. Este livro torna-se um sucesso como empreendimento historiográfico, já que se trata de um livro-experiência em pró da transformação, e não um mero livro-verdade ou livro-demonstração.As experiências dita transformadora, ficam claras em obras foucaltianas da década de 70 e 80, em que focava nos modos de subjetivação, ética e governamentabilidade, pois denunciava a compreensão identitária e subjetiva sob a forma de componentes compreendidos como naturais e profundos. O próprio autor afirma, praticar uma espécie de ficção história, sob o propósito de interferindo entendimento que fica entre nossa realidade e o que se sabe da história passada.

Um dos filósofos bastante admirados por Foulcault foi Nietzche, que emite a idéia de que não é interessante relacionar os homens ao seu tempo, mas sim que a cada momento eles estejam em luta contra seu tempo, o que significa que a obras trazidas por autores seja eles qual for deveriam ter "efeito sobre a vida e sobre a ação". Foucault mesmo numa entrevista em 1978 para Ducio Trombadori relata que um experimentador, mais do que um teórico, constrói seus livros a partir de experiências, sendo esta caracterizada pela transformação que traz e se encontra na escrita para mudar a si mesmo e aos outros. Estaria se falando de uma des-subjetivação, pois seria o ato de "arrancar o sujeito de si mesmo, fazer com que ele não seja mais ele mesmo". No fim, esse tipo de livro possibilitará estabelecer novas relações.

Conde conclui que os livros-experiências psi não nos intoxicaria com saberes psicológicos pretensamente nobres, orgânicos e maiores, como os livros-verdade ou livros-demonstração. Por isso que no texto-apresentação do livro "Foulcault e a Psicologia", a autora busca fazer articulações entre biografia, temporalidade e experiência, por se sentir tocada pelas idéias das "experiências biográficas transformadoras" dos autores que compõem o livro. Estes autores seriam o exemplo de que se pode ir além das grandes narrativas e ter livros tal qual obras de arte que se propõem fazer arqueologias, problematizações auto-reflexivas e interferências em jogos de verdade. A alternativa de se fazer livros-verdade seria uma tentativa de iluminar o olhar daqueles que só enxergam um ilusório descaminho, isto por estarem desimplicados com a realidade, precisando nada mais do que se livrar do que sufoca e com isso "respirar junto", assim como menciona Guatarri, indicado pela autora, como se houvesse conspiração realizada pelos leitores destes livros.

2 comentários:

Kleber disse...

texto fechado. na reunião a gente dá prosseguimento a sua apresentação. seria interessante uma leitura prévia, bem como, quem puder, levar impresso. abraço!

Anônimo disse...

Estou a procura do texto da heliana conde que você comentou no meu texto e olha quem encontro!

Saudade.

Estou tateando o projeto de qualificação II.

Bj

Ana PAula